O mundo segundo o jornal das oito
- antonio carlos Provesi
- 4 de set. de 2014
- 3 min de leitura

Ticiana Villas Boas e Ricardo Boechat no “Jornal da Band”
Na última segunda-feira, 1 de setembro, o “Jornal Nacional” completou 45 anos de vida. Sua história praticamente se confunde com a dos noticiários na TV. Muita água rolou nessas quatro décadas e meia– e algumas vezes uma água bem lodosa, diga-se. No portal, “Memória Globo” (sobre o qual já falamos aqui) há uma alentada retrospectiva desse quase meio século de vida. Houve um tempo que o “JN” praticamente reinava sozinho. Em 1969, quando estreou, seu principal concorrente era o “Repórter Esso”. O “JN”, porém, foi o primeiro jornal a ser transmitido simultaneamente, ao vivo, para São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e Brasília, tornando-se, assim, o primeiro noticiário em rede nacional da TV Brasileira.
Ao longo de sua existência o “JN” foi ganhando muitos companheiros de horário – aquilo que convencionalmente chamamos de “jornal das oito”. Os principais são o “SBT Brasil”, o “Jornal da Record” e o “Jornal da Band”. E, não – eles não estão elencados por ordem de importância.
O tal “jornal da oito” raramente começa às oito, principalmente agora, em época de Horário Político – a exceção, veja só, é o “JN”.
Há mais afinidades do que diferenças entre esses telejornais. A começar pelo fato de todos serem apresentados por casais: Rachel Sheherazade e Carlos Nascimento/ Joseval Peixoto no “SBT Brasil”, Adriana Araújo e Celso Freitas no “Jornal da Record”, Ticiana Villas Boas e Ricardo Boechat no “Jornal da Band”, Patrícia Poeta e William Bonner no “Jornal Nacional”.
O que muda sutilmente de um para o outro é a escolha e hierarquização de suas pautas. Diz muito sobre quem e como o dito telejornal pretende atingir com sua seleção de notícias.
Há algum tempo William Bonner causou polêmica ao comparar o espectador do “Jornal Nacional” com o personagem Homer Simpson – um sujeito com capacidade de compreensão medianapara quem a informação deveria chegar bem mastigadinha. Ironicamente, porém, o “JN” não é o telejornal que mais “homeriza” (inventei agora, ok?) o telespectador.
Vejamos: o “SBT Brasil” abre seu bloco de notícias enfileirando uma série de ocorrências criminais – sacoleiro morto por bandidos, morador de rua arrastado por segurança, golpistas presos, bebê abandonado no telhado e resgatado pelos bombeiros. O cardápio policial avança noticiário adentro. Proporcionalmente falando, é o coração do telejornal. Mais para o fim há uma concentração de notícias de política (o dia dos candidatos, pesquisa eleitoral) e uma coleção de fait divers: o soldado britânico engraçadinho, uma briga entre homens fantasiados de Bob Esponja e Mickey etc. Fica evidente que a ideia é segurar o espectador com um tipo de informação mais sensacionalista e ir amenizando gradativamente.
A estrutura do “Jornal da Record” não é muito diferente: um bloco de notícias policialescas seguido de blocos com previsão do tempo, notícias de política e notícias internacionais. Diferentemente dos concorrentes, no entanto, o “Jornal da Record” continua depois do Horário Político com uma reportagem especial. É, inclusive, o mais longo dos quatro jornais.
O “Jornal da Band”, por sua vez, é o mais editorializado de todos. O âncora Ricardo Boechat não se priva de dar sua opinião – às vezes bem contundente – sobre diversos assuntos – é o caso da punição do Grêmio por racismo e da liberação por parte do Senado dos inibidores de apetite. O assunto, inclusive, foi tratado em outros telejornais, mas sem que nenhum apresentador emitisse opinião. O “JB” também pega bem mais leve no quesito notícias criminais.
Já o “Jornal Nacional” opta pela eficiência técnica. Nada de comentários, trinta minutinhos bem contados e as principais notícias do dia (na opinião dos seus editores) logo de cara. Na quarta, com Heraldo Pereira substituindo Bonner, a primeira notícia foi a reação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa – sobre a liberação dos inibidores de apetite. Seguiu-se, então, informações sobre as ventanias e tempestades que assolaram o Sul e o Sudeste e a previsão do tempo. Ou seja, cada um tem sua noção própria de prioridade. O “JN” também dedicou boa parte do noticiário às pesquisas eleitorais. Curioso o binômio previsão do tempo/política.
Como se vê, a percepção do mundo pode ser muito diferente a depender do telejornal que se assiste. Cabe a cada um escolher o que quer perceber.
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